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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O pânico da inexistência


                        Alvaro Acioli

A cidadania deixou de ser apenas o que define direitos individuais e costumes dos que nascem em um mesmo território. A cultura do efêmero, do sucateamento programado, consagrou uma interdependência entre cidadania e consumo. Somos cidadãos-consumidores de julgamentos, comportamentos e atitudes - criadas pelo marketing - que raramente correspondem às nossas necessidades, gostos e expectativas.
Na sociedade atual boa parte da racionalidade das relações se constrói, não em disputas, mas justamente pela posse de símbolos que conferem prestígio ou afirmação .  Consumir tornou-se participar de um cenário de disputas por aquilo que é produzido e pelos modos de usar. O consumo é um não-lugar onde os conflitos entre classes, originados pela desigual participação social, se manifestam através da distribuição e da obtenção de coisas.
Curiosamente a sociedade que transformou a todos em consumidores até do futuro continua tratando a maioria como cidadãos de um longínquo passado. E como não é universal o acesso aos bens materiais ou simbólicos a massa não se sente existindo, vivendo uma cidadania plena.
Até nas mega cidades globais a prosperidade contrasta com formas gritantes de pobreza, com índices brutais de exclusão social. Essa contradição é mais grave nos países subdesenvolvidos e nas metrópoles onde uma política seletiva exclui a maior parcela dos direitos humanos básicos : trabalho, saúde, educação e moradia.
Mas a lógica que rege a apropriação dos bens, enquanto objetos de  distinção, não é a da satisfação de necessidades e sim a da escassez desses bens ou a do desejo de impedir que outros venham a possuí-los. Consumir, mesmo que  consumindo-se, tornou-se uma necessidade quase universal.
Os excluídos também estão tentados a sair da marginalidade através da fúria consumista. É assim que reagem à ideologia de mercado dominante, para a qual só existe aquele que tem ou pode vir a possuir. É justamente o pânico da inexistência psicológica que está levando muitos excluídos a querer ser ( ter ) a qualquer custo; mesmo que seja da própria vida.
Aumentou extraordinariamente o número dos que não têm nada a perder e, por isso mesmo, nada mais a temer. Não é com barbarismos que se vai neutralizar a atual escalada de crimes hediondos. É uma ingenuidade imaginar que esse drama social se resolve com mais vigilância e punições mais severas. A sociedade precisa é de mais humanidade e menos presídios.