Alvaro Acioli
A atuação humana perdeu completamente a
espontaneidade; os gestos mais simples reproduzem padrões condicionados,
refletem conceitos ou preconceitos. O homem já encontra, ao nascer,
compromissos definidos, sendo-lhe crescentemente difícil viver os infinitos
padrões e caminhos recomendados. E o impacto causado pela tecnologia da informação
influencia a realização de todos os papéis sociais.
O comportamento assumido em função da
experiência foi substituído pela representação imposta. Outrora o comportamento
revelava nossas motivações íntimas, facilitando a compreensão. Hoje os modismos
forçam uma obediência automática. Cumprir as regras, sem discuti-las, é uma
realidade quase universal.
Acabamos escravizados pelas máquinas
criadas para dominar os animais. Antes do grande salto as mudanças era lentas;
mantinham-se por muitas gerações. Agora, conceitos e valores discutíveis geram
critérios cada vez mais precários.
Do bom ao mal, do moral ao imoral, do
certo ao errado, tudo se tornou questionável. O viver complicou-se
extraordinariamente e todos precisam agora reorientar suas existências. O
natural, o simples, tem de ser redescoberto. Cabe indagar: o homem terá ainda
tempo para transformar-se, decifrar a relação indefinida entre ele e seu mundo?
Conseguirá esse mesmo homem defender-se da ação do tempo, que ameaça afundá-lo
no anonimato e na banalidade? Aprenderá a prevenir-se e proteger-se do
indiferentismo, da dispersão, da infidelidade a si mesmo?
O que vai definir a aparência da
sociedade futura será a capacidade humana de superar a precariedade da
existência, aprendendo a realizar-se dentro dos limites impostos pela vida
social. Para vencer a tragédia de sua finitude, o homem tem que decidir-se a
assumir o seu instante, o dia-a-dia, sem adiar eternamente os seus projetos.
Somente assim ele reencontrará a motivação capaz de restabelecer o amor pela
vida e pelo viver.
Estamos condenados à coexistência.
Qualquer realização pessoal tem de começar pelo respeito à dignidade dos
semelhantes. Uma nova socialização precisa vincular direitos individuais com
responsabilidades sociais. Fora desses princípios é praticamente impossível
impedir a perpetuação do desencontro social.
A instrução deve continuar como a
principal função do Estado. Mas a educação, indispensável para o uso adequado
da instrução, permanece como a grande missão da família. Principalmente a
iniciação dos usos e costumes, normas e comportamentos, hierarquias e valores.
Além dos cuidados físicos cabe ainda à família dar amor e proteção. A educação
tem de ser repensada mais em termos de caminhada que de objetivos; como eu vou
e não para onde eu vou.
Os problemas da vida precisam ser
ensinados como acontecimentos possíveis, que podem contribuir para o
crescimento pessoal, se abordados adequadamente. O homem perpetuará os seus
conflitos se insistir em não aceitar essas condicionais. E perderá,
definitivamente, a chance de construir um novo projeto humano.